Identificação laboratorial das anemias

Conceitualmente o estado clínico de anemia é definido pela diminuição da quantidade da hemoglobina no sangue conforme seus respectivos padrões quantitativos para sexo e idade. A identificação de anemias obedece sequências analíticas bem estabelecidas, porém para um texto curto como este optei por apresentar quatro casos que exemplificam a forma como eu procedo. Caso 1- Adulto, ou adolescente, relata fraqueza e cansaço desde a infância.

Esta história clínica nos remete à suspeita de que a anemia possa se hereditária devido à precocidade dos sintomas. Identificação da anemia neste caso: Analiso os resultados do eritrograma para: a) esferocitose hereditária (CHCM elevado), b) talassemias (VCM e HCM diminuídos), c) pesquiso a morfologia eritrocitária em busca de esferócitos (esferocitose), micrócitos hipocrômicos, dacriócitos e microesquisócitos (talassemias), eritrócitos “mordidos”(deficiência enzimática de G6PD) e células falciformes (doença falciforme), entre outras. Para concluir o diagnóstico laboratorial aplico exames específicos conforme a minha suspeição: eletroforese de hemoglobina para talassemias e doença falciforme, curva de fragilidade osmótica para esferocitose, e dosagem de metaemoglobina e pesquisa citológica de corpos de Heinz para deficiência de G6PD.

Caso 2- Anemia em mulher adulta com sangramento por conta de mioma uterino. Este é um caso típico de sangramento com perda de ferro e que induz a ferropenia. Identificação da anemia deste caso: Analiso os resultados do eritrograma para anemia ferropênica (VCM e HCM diminuídos) e a morfologia eritrocitária para avaliar a presença de micrócitos hipocrômicos. Para concluir o diagnóstico laboratorial é importante determinar o perfil de ferro: ferro sérico, capacidade total de ligação do ferro, saturação de ferro e ferritina. Caso 3: Paciente ictérico com dores no corpo, fraqueza e cansaço que tem se intensificado nos últimos quatro dias. Suposições: hepatopatias ou anemia hemolítica. Ao descartar a hepatopatias a suspeita recai em anemia hemolítica.

A pergunta seguinte é: - Quando surgiram os sintomas acompanhados da icterícia? Se foi após uma pescaria, por exemplo, é provável que a anemia hemolítica tenha sido causada pela malária. Por outro lado, se a resposta foi de que a icterícia e os sintomas surgiram de forma súbita, a possibilidade direciona para anemia hemolítica autoimune. Identificação da anemia deste caso: Analiso os resultados do eritrograma para conhecer a extensão da anemia, a contagem de reticulócitos (geralmente elevada nas anemias hemolíticas). Se a suspeita for para a malária, a melhor análise é a pesquisa de plasmódios intraeritrocitários. No caso de presumir por anemia hemolítica autoimune, a análise indicada é o teste de Coombs direto – se resultar positivo confirma este tipo de causa de anemia hemolítica. Caso 4: Rapaz aparentemente saudável relata fraqueza e dores nas pernas desde a infância, não pratica esportes e é sedentário.

Os eritrogramas feitos sempre se mostraram normais. Para situações iguais a esta a suspeita mais comum é que seja portador de talassemia mínima (alfa ou beta). Identificação da anemia deste caso: Analiso os resultados do eritrograma com foco especial nos valores de HCM e VCM, se um ou outro, ou ambos, estiverem diminuídos, a suspeita de talassemia mínima se torna mais provável. Como exame específico opto por eletroforese ou cromatografia de hemoglobinas. Se a Hb A2 estiver elevada, trata-se de talassemia beta mínima, porém se a Hb A2 estiver normal, ou diminuída, direciono para pesquisa de Hb H através de eletroforese alcalina ou neutra. Se a Hb H estiver presente na eletroforese, trata-se, de fato, de talassemia alfa mínima.

A talassemia mínima atinge 20 a 30% da nossa população. O termo mínima se aplica porque em geral a hemoglobina total está normal, mas a pessoa reclama de cansaço, dores nas pernas, etc. Enfim estes são alguns exemplos de uma série muito maior. No próximo mês o tema será Identificação laboratorial das anemias microcíticas.

 

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